CONTESTAÇÃO
 

OBJETO: PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 18/2022
AUTOR: Bruno Alfredo Laureano
EMENTA: INSTITUI O PROGRAMA DE TELEMEDICINA PRONTO ATENDIMENTO DIGITAL NA REDE PÚBLICA DE SAÚDE DE ITAJAÍ.



I - RAZÕES DA CONTESTAÇÃO


 O VEREADOR que a esta subscreve, na forma regimental, vem através da presente, tempestivamente,  apresentar  CONTESTAÇÃO  ao respeitoso parecer ao Projeto de Lei Ordinária nº 18/2022, exarado pela relatora desta Egrégia Comissão de Legislação, Justiça e Redação Final da Câmara de Vereadores de Itajaí, nos termos do artigo 63, §1º e 2º do Regimento Interno desta Casa de Leis, pelas RAZÕES que a seguir aduz:
 
Trata-se do Projeto de Lei Ordinária nº 18/2022, de autoria do Vereador Bruno Alfredo Laureano, que institui o Programa de Telemedicina Pronto Atendimento Digital na Rede Pública de Saúde de Itajaí.
 
Segundo a propositura, considera-se telemedicina o pronto atendimento digital com o objetivo de atender os pacientes com quadro de baixa complexidade.
                          Reitera-se aqui que a iniciativa parlamentar para este Projeto de Lei  está amparada  na Lei Orgânica do Município, vejamos:
 
Art. 29. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer Vereador ou Comissão, ao Prefeito e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Lei
 
§ 1º São de iniciativa privativa do Prefeito as leis que:
I - criem a Guarda Municipal;
II - disponham sobre:
a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autarquias, de sua remuneração. Exceto, os vencimentos do Prefeito, Vice-Prefeito;
b) servidores públicos do Município, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;
c) criação, estruturação e atribuições das secretarias municipais e órgãos da administração pública municipal.

 
                O Regimento desta Casa também, nos artigos 197 e 198, não deixa dúvidas acerca da iniciativa parlamentar:
 
Art. 197. Os projetos de emenda à lei orgânica,  lei complementar ou ordinária, de decreto legislativo e de resolução são os meios pelos quais a Câmara de Vereadores exerce a sua função legislativa.
 
Art. 198. Os projetos de lei complementar ou ordinária se destinam a regular as matérias de competência do Município com a sanção do Prefeito e sua iniciativa cabe a qualquer Vereador, às Comissões Técnicas, ao Prefeito e aos cidadãos, ressalvados os casos de iniciativa privativa do Prefeito, previstos em lei

 
No mérito, o projeto está em sintonia com a Lei Federal nº 13.989, de 15 de abril que 2020, que autoriza a telemedicina em âmbito nacional.
O projeto, na prática, pretende tornar "permanente" uma possibilidade já existente na legislação em vigor, porém restrita ao período emergencial que atravessamos.
A prática foi autorizada pelo governo brasileiro desde abril, de forma emergencial por conta da pandemia, por meio da Lei Nº 13.989/20. No entanto, o debate para a aplicação dessa modalidade de tecnologia na Medicina vem sendo discutida pelo Conselho Federal de Medicina há pelo menos 20 anos.
Vale ressaltar, que fica assegurado a liberdade e independência do médico na decisão de utilizar ou não a telemedicina, indicando a consulta presencial sempre que entender necessário.
Também estabelece que a prática da telemedicina deve ser executada por livre decisão do paciente, ou de seu representante legal, e sob responsabilidade profissional do médico.
Veja-se que o presente projeto não cria atribuições diversas àquelas inerentes a qualquer administração.
O acesso à saúde, enquanto direito social, é prerrogativa do cidadão e dever do Estado, o qual gera a prevenção, retorno rápido ou manutenção do cidadão ao seu cotidiano, aos meios de produção, lazer e estudo, as quais são responsabilidades diretas e obrigatórias do poder público.
Há que se considerar, ainda, que a garantia fundamental do acesso adequado à saúde do cidadão é ato que se insere no poder-dever do Poder Público local, que dela não pode se eximir.
Logo, não merece acolhida o argumento de que cria ônus e obrigação a órgãos do Poder Executivo.
 Cuida-se, na verdade, de ato normativo que não representa nenhuma intromissão em ato de gestão do Município, vale dizer, sem inovar nas atribuições da Administração local.
 
Vale ressaltar que o STF, em julgado proferido no recurso extraordinário com agravo em repercussão geral reconhecida, interposto pela prefeitura do Rio de Janeiro, firmou o entendimento no sentido de que a simples criação de despesas ao Município pelo Poder Legislativo não afasta a iniciativa concorrente do parlamentar:
 
Recurso extraordinário com agravo. Repercussão geral. 2. Ação Direta de Inconstitucionalidade estadual, Lei 5.616/2013, do Município do Rio de Janeiro. Instalação de câmeras de monitoramento em escolas e cercanias. 3. Inconstitucionalidade formal. Vício de iniciativa. Competência privativa do Poder Executivo municipal. Não ocorrência. Não usurpa a competência privativa do chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para a Administração Pública, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos. 4. Repercussão geral reconhecida com reafirmação da jurisprudência desta Corte. 5. Recurso extraordinário provido. (ARE 878911, relator Ministro Gilmar Mendes, p. no DJE e, 11.10.2016).
 
Do corpo do acórdão, extraio a seguinte passagem do voto:
 
“O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento no sentido de que as hipóteses de limitação da iniciativa parlamentar estão taxativamente previstas no art. 61 da Constituição, de que trata da reserva de iniciativa de lei do Chefe do Poder Executivo. Não se permite, assim, interpretação ampliativa do citado dispositivo constitucional, para abarcar matérias além daquelas relativas ao funcionamento e estruturação da Administração Pública, mais especificamente, e a servidores e órgãos do Poder Executivo. Nesse sentido, cito o julgamento da ADI 2.672, Rel. Min. Ellen Gracie, redator p/ acórdão Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, DJ 10.11.2006; da ADI 2.072, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 2.3.2015; e da ADI 3.394, Rel. Min. Eros Grau, DJe 215.8.2008, este último assim ementado, no que interessa: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL NÃO ACOLHIDA. (...) 1. Ao contrário do afirmado pelo requerente, a lei atacada não cria ou estrutura qualquer órgão da Administração Pública. Não procede a alegação de que qualquer projeto de lei que crie despesa só poderá ser proposto pelo Chefe do Executivo. As hipóteses de limitação da iniciativa parlamentar estão previstas, em numerus clausus, no artigo 61 da Constituição do Brasil --- matérias relativas ao funcionamento da Administração Pública, notadamente no que se refere a servidores e órgãos do Poder Executivo. Precedentes. Assim, somente nas hipóteses previstas no art. 61, § 1º, da Constituição, ou seja, nos projetos de lei cujas matérias sejam de inciativa reservada ao Poder Executivo, é que o Poder Legislativo não poderá criar despesa.”
 
 
O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em julgamento realizado em maio de 2018, na ADI 4022451-15.2017.8.24.0000, assentou a validade da norma de origem legislativa, desde que esteja objetivando direito FUNDAMENTAL, como é o caso:
 
Com o julgamento do ARE n. 878.911 RG/RJ, o Supremo Tribunal Federal resolveu o Tema n. 917 de Repercussão Geral, fixando o entendimento de que “não usurpa a competência privativa do chefe de Poder Executivo lei que embora crie despesa para a administração pública, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos”. Ao lado disso, com base em interpretação dos recentes julgamentos do Supremo Tribunal Federal e deste Tribunal de Justiça, há que se entender que somente não trata da estrutura ou da atribuição dos órgãos do Executivo a lei de origem parlamentar que imponha àquele Poder a obrigação de concretizar direito fundamental  - de qualquer dimensão ou geração -, pois, nesses termos, não estaria criando nova e injustificada obrigação; estaria apenas concretizando aquilo que já está constitucionalmente inserido entre as obrigações positivas do Estado. Assim, a criação injustificada de nova obrigação, como a troca gradual de lâmpadas convencionais por led nos prédios, vias e espaços públicos, à míngua de qualquer motivado sustentada na concretização de direitos fundamentais, representa irregular ingerência na rotina administrativa do Executivo e, portanto, caracteriza invasão da iniciativa privativa do Chefe daquele poder.
 
Extrai-se corpo do acórdão:
 
Verifica-se desse julgamento que o Supremo fixou, especialmente, dois entendimentos: a) leis que geram despesa não são de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, ou seja, o Legislativo pode criar despesa à conta do Executivo; b) a leitura das hipóteses de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo deve ser restritiva. E quanto a esse último entendimento é possível extrair da última parte do voto vencedor do Ministro Gilmar Mendes, embora isso não tenha sido dito de forma expressa, que não haverá invasão da iniciativa reservada ao Chefe do Executivo quando se tratar de lei que busque de forma direta e evidente concretizar direitos fundamentais, de qualquer uma das três dimensões ou gerações, na medida em que, nesses termos não estaria criando obrigação nova e injustificada ao Executivo; estaria apenas concretizando aquilo que já está constitucionalmente inserido entre as obrigações positivas do Estado. Isso fica mais claro a partir da análise de precedentes mais recentes, em que já se adotou o resultado do Tema 917, valendo citar: CONSTITUCINAL. PROTEÇÃO À SAÚDE E AS PESSOAS COM DEFICIÊNCIAS. LEI 16.285/2013, DE SANTA CATARINA. ASSISTÊNCIA A VÍTIMAS INCAPACITADAS POR QUEIMADURAS GRAVES. ALEGAÇÕES DIVERSAS DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. VÍCIOS DE INICIATIVA. INEXISTÊNCIA. [...] 1. Os artigos 1º, 4º, 6º e 7º da lei impugnada não afrontam a regra, de reprodução federativamente obrigatória, que preserva sob a autoridade do Chefe do Poder Executivo local a iniciativa para iniciar leis de criação e/ou extinção de Ministérios e órgãos da Administração Pública (art 61, §1º, II, “e”, da CF). Mera especificação de quais cuidados médicos, dentre aqueles já contemplados nos padrões nacionais de atendimento da rede pública de saúde, devem ser garantidos a determinada classe de pacientes (portadores de sequelas graves causadas por queimaduras). 2. A cláusula de reserva de iniciativa inscrita no art 61, § 1º, II, “b”, da Constituição, por sua vez, não tem qualquer pertinência com a legislação objeto de exame, de procedência estadual, aplicando-se tão somente aos territórios federais. Precedentes. 3. Inocorrência, ainda, de violação a preceitos orçamentários, tendo em vista o acréscimo de despesas públicas decorrentes da garantia de assistência médica especializada a vítimas de queimaduras...
 
Dito isso, com base no acórdão supracitado, resta cristalino que não usurpa a competência privativa do chefe do Poder Executivo o projeto de lei aqui proposto, mesmo que venha gerar despesa ao Poder Executivo.
Assim sendo, o fato de alguma despesa ao erário ou atribuição ao governo municipal decorrer da lei de origem legislativa não tem o condão, por si só, de macular de inconstitucionalidade o texto do projeto de lei ora impugnado.  
Acaso fosse assim, o legislativo não mais poderia realizar sua função típica sem autorização do Executivo, porquanto, em certa medida, toda lei ocasiona despesas.
                Estas, Excelentíssimo Presidente, são as razões que demonstram inequivocamente que o Projeto de Lei nº 18/20122 não contém qualquer vício que o torne inconstitucional ou ilegal, pelo que este Vereador REQUER o seu recebimento e a sua discussão pelos membros da r. Comissão, para que seja declarado constitucional e legal, a fim de que seja levado a Plenário para votação.
 
 
Nestes Termos
Pede e espera deferimento
 
Itajaí, 13 de maio de 2022.



 
 
Bruno Alfredo Laureano